quarta-feira, 1 de maio de 2013


Oportunidade à vista - Trabalho dá nova chance a presos


Por Gabriela Rovai (Diário Catarinense, 28/4/2013)
Com 40,4% dos detentos ocupados, SC lidera ranking de atividade laboral nas prisões do país
A atividade laboral é o principal caminho para a ressocialização de presos e, neste cenário, Santa Catarina é o estado com maior número de detentos trabalhando, conforme dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça, divulgados na última semana. Segundo o levantamento, o Estado ocupa 40,4% de sua população carcerária.
Um índice positivo, visto que apenas 20% dos encarcerados do Brasil têm tal oportunidade. Para avançar ainda mais, a sociedade civil precisa se engajar à causa e ainda obter vantagens econômicas com isso.
Empresas que contratam detentos como mão de obra têm feito um bom negócio. Entre as vantagens estão a economia com a folha de pagamento, já que os presos dos regimes semiaberto e fechado não trabalham com carteira assinada, pois eles não estão sujeitos ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho. Dependendo do piso salarial, a economia pode chegar a 50%. Isso porque os empregadores têm incentivos legais. Eles são isentos de encargos trabalhistas como FGTS, férias e 13o salário.
A remuneração mínima corresponde a três quartos do salário mínimo. Normalmente, nos convênios firmados entre empresas e presídios, é estipulado um salário mínimo como pagamento.
Contudo, o limite máximo de contratação de detentos pelas empresas é de 10% do total de empregados da obra ou serviço, conforme estabelece a Lei de Execuções Penais. A regra não tem validade para egressos do sistema penitenciário.

Disciplina é um dos diferenciais
Entre as vantagens obtidas pelo empregador estão a disciplina e o comprometimento dos presos com o trabalho. Encarregado das oficinas da Mormaii no Presídio Regional de Blumenau, Lúcio Pires destaca a qualidade da mão de obra.
– Prefiro trabalhar com os presos, porque têm mais disciplina e respeito. Tudo que eu peço eles fazem – disse.
A Mormaii montou uma estrutura de fábrica na unidade, com ferramentas e prensa pneumáticas e compressor com ar-comprimido. Ali ninguém ganha menos que um salário mínimo.
Assim como em outros convênios, parte da remuneração é depositada numa poupança para ser retirada quando o preso sair e outra parte para indenizar danos causados pelo crime cometido pelo detento.
O gerente industrial da Mormaii, Ronaldo Gerent, observa que é vantagem o trabalho com presidiários por seu foco e capacidade produtiva e pela escassez de mão de obra e falta de capacitação de candidatos no mercado. Ele afirma também que a empresa está aberta à contratação de egressos.
– A experiência na unidade é excelente. E egressos que quiserem trabalhar na Mormaii só precisam procurar o setor de recursos humanos. Hoje tenho 40 vagas. Se hoje saíssem 40 homens com o perfil necessário, estariam empregados – diz Gerent.
O Estado possui convênios com empresas e entidades como a Mormaii, Fischer, Tashiba, Instituto de Estudos e Pesquisas sobre Violência e Criminalidade de Itajaí, Hering, Da Cor do Pecado, entre outras. E está aberto a novas parcerias para melhorar ainda mais o índice catarinense.

Material até para exportação
Venezuela, República Dominicana e Paraguai são destinos dos biquínis produzidos por detentas do Presídio Regional de Itajaí. Uma sala arejada e bem iluminada com carretéis coloridos, máquinas de costura profissionais e tecidos de diferentes padronagens é a oficina da empresa de moda praia Da Cor do Pecado.
Lá dentro, 26 mulheres produzem cinco mil biquínis e saídas de praia por mês em turnos de seis horas por dia. Elas são as costureiras da marca e receberam treinamento para isso. Algumas já sabiam costurar. É o caso de Érica de Lima, 29 anos, que aprendeu o ofício aos 14 e chegou a trabalhar com moda infantil.
Condenada a seis anos de prisão, ela diz com orgulho que é overloquista.
– É o início de toda peça. Recebemos o modelo e os tecidos cortados. Meu trabalho é montar os biquínis que podem ser usados dos dois lados – explica.
Para Érica, o trabalho mantém a mente ocupada, ensina disciplina e a respeitar o espaço uma da outra. Ela garante que muitas mulheres querem trabalhar.

Outras experiências positivas
No Presídio Regional de Blumenau, o sonho de Isaías Lopes, 44 anos, é simples: buscar a filha de 12 e o netinho de seis na escola. Cumprindo o sexto ano de detenção e atualmente no regime semiaberto, o pintor predial pode conquistar mais rápido seu objetivo com a remissão da pena de 34 anos por meio do trabalho. Há sete meses, ele foi um dos escolhidos para trabalhar na oficina da Mormaii, uma das principais marcas de surfwear do país, onde são produzidas cerca de 1,2 mil rodas e média de 300 bicicletas por dia.
Na Penitenciária do Complexo do Vale do Itajaí, Marcos de Oliveira, 39, Emerson Alves, 31, e Luiz Carlos dos Passos, 39, são os primeiros participantes de outro projeto do Departamento Estadual de Administração Prisional (Deap). É o Cadeirantes em Ação, piloto desenvolvido na unidade e que servirá de referência para o sistema prisional catarinense. A ideia vai além de encontrar uma ocupação para presos que usam cadeira de rodas: deve aproveitar mão de obra qualificada e oportunizar a inserção na sociedade.